08 - SONHO e REALIDADE
Sonho e realidade.
Folhas paralelas, inseparáveis, avançavam nos
lugares mais inóspitos da mente de Carlota.
Nesses locais, nessas folhas, estavam desenhados
círculos imaginários que se retorciam e giravam sem cessar. Ela era prisioneira
do seu próprio sonho, e julgava ter sido lançada para o meio dessas linhas onde
se fabricavam todas as situações inexplicáveis que lhe iam ocorrendo.
O sino da torre tocou no seu sonho, e tocou na
realidade.
O som que fez foi quase idêntico, o ar vibrou no
mesmo comprimento de onda e possuía a mesma temperatura.
Na realidade, o tempo moveu-se na direção oposta à
do sonho, e o vento fez-se sentir, o que tornou o ruído mais abafado.
No sonho, tudo aconteceu com maior nitidez, apesar
das cores serem menos vibrantes, e o som do sino foi mais audível.
Tudo o mais foi idêntico, mas apenas no ínfimo
intervalo entre essas folhas se podia decifrar qual delas era uma, e qual era a
outra.
Folha do sonho, folha da realidade, e Ana Carlota
tinha logo de ter ficado entalada nesse espaço, nesse ínfimo intervalo que as
separava e de onde é muito difícil conseguir escapar. Fugiu de casa com tanta
rapidez que entrou naquele espaço acanhado sem se ter apercebido. No dia em que
isso aconteceu, tudo aumentou de tamanho e ficou maior do que o mundo. Ela não
sabia, nem podia adivinhar, mas ao fazê-lo deixou de pertencer ao mundo dos
sonhos, e também deixou de fazer parte da realidade.
Não entendia o que se estava a passar com ela, e
ficou com medo de sonhar. Ter medo de sonhar era muito pior do que ter medo da
realidade, mas isso ela já sabia.
Carlota culpou os seus sonhos por todo aquele
desgoverno.
O cheiro a vomitado continuava bem presente e ativo
na sua memória, o que muito a incomodava, mas mesmo assim ela não parava de
correr, jurou a si própria fazê-lo apenas quando voltasse a ser confrontada com
uma sensação de aparente realidade. Necessitava de ter essa garantia, e ainda
não se sentia suficientemente segura para parar de correr.
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